quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Inércia





Pensava. Não agora, não depois, não adiante... Pensava, refletia, escolhia.
Mas agia? Era muito covarde para tanto.
Parado, lento, observava o tempo. Adorava. Idealizava. Esperava.
De repente, pausa!
O silencio se rompia e algo se quebrava no ar.
Não esperou mais. Agiu. Correu, desesperado. De súbito, soltou uma palavra e o nada saiu de sua boca.
Esperou tanto que perdera o som. O compasso. O ritmo.

O tempo lhe fora ingrato.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Despertar



Porque isso é o que nos define...

Silêncio. 

Ele olhou para ela, confuso. Distanciou-se do parapeito, tentando entender aquela frase. Não fazia sentido... Não com o que sentira até agora. Não fazia o menor sentido! O mundo rodava e ele mergulhava naquele mar de indecisão. O que fazer? E o mundo não parava, exigia dele uma resposta. Do alto daquele prédio, eles esperavam uma resposta.

Aquele som inesperado...

Ele passou por ela e dirigiu-se à saída. Ele sorriu. Estava disposto a dar respostas e a entender melhor aquele mundo. Disposto a esquecer que um dia a conheceu, embora soubesse que isso não seria mais possível. Decidiu que entenderia o significado de viver. Um dia, entenderia. 

Um dia.

"E ela?", você me pergunta. Ela caminhou até o parapeito e seguiu-o com o olhar. Viu que, naquele mar de gente, ele vivia. Às vezes, errava, mas procurava as respostas certas. De vez em quando, ele olhava pra cima, mas com um olhar tão inexpressivo, que ela não tinha certeza se era por hábito ou se era saudade. Antes de descer, ela gritou para ele:

- Nunca esqueça que nós somos eu e você!

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Dúvida




"Preste atenção", era o apelo dele. Ela então acordou do estado que se encontrava. Perguntava-se o que fazia ali e quanto tempo havia perdido. Preocupada, não notou o estado de desespero que ele se encontrava e ele julgou isso como desprezo. Ela levantou-se e ele retraiu a mão que ia em direção aos cabelos dela.

- Consegue escutar esse som? Parou...

Ela fingiu não ouvir e continuou, decidida. Sofreu, pois não ouviu passos atrás de si. "Siga-me", implorava em silêncio, mas ele não saiu do lugar. Estava próximo ao parapeito e ficou olhando o mundo lá fora. "O que será que essas pessoas pensam?", refletiu. Olhou para ela e estendeu a mão:

- Você vem?

Ela parou quando ouviu a pergunta. Olhou para ele e o encarou com uma expressão de medo. O ar estava pesado, faltava fôlego. Ela não queria ser tão definitiva. Não naquele momento. Puxou o ar e sentiu como se agulhas tivessem perfurado o seu pulmão. O som que saiu de sua boca era pungente:

- Quando eu e você viramos nós?

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Dor




Revivendo as velhas sensações. Era assim que continuava. Revisitando cada lugar, cada espaço. Agora, a presença dela era quase ausência. O mundo ia passando e ele completamente imerso naquele oceano de torpor. Uma sensação antiga e extremamente familiar.

-  O importante era aquele momento. O eu daquele momento.

As memórias fluíam e o presente estava ali ao lado dele. Minto, pois ele ignorava completamente o presente.  Estava escutando o som do passado e não se preocupava. Ecos de vida. Ecos de existência. Vivia todas aquelas sensações tão... mortas.

Lembrou-se que ela estava ali ao seu lado. Colocou a cabeça em seu ombro. Suspirou.
As pessoas ignoravam aquele som alto. Viver era mais importante.
Mas eles prestavam atenção em cada nota.
Prestam.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Desgosto




Era nítido que ela estava ali. Não poderia simplesmente ignorá-la, não é? Não como ela havia feito... Mas o que fazer? Esperar? De novo?! Calma, esse som não pode ser tão intenso e descompassado... Mas a pergunta ainda era a mesma: o que fazer? Apenas sabia que não consideraria a espera.

- Desligar-se?

Não era vingança? Sempre pensando no que os outros pensariam, mas nunca o admitindo... Andava cansado de dar satisfação e queria apenas desistir. De uma vez por todas. O problema era a expectativa alheia. E doía saber que se fosse embora, ela não sentiria. Sabia que iria sobreviver, pois já passara por isso, mas doía. Ainda dói. Certo?

É por isso que ele sempre entra nessa crescente.
De frases curtas e rápidas. Quase imperativas.
É por isso que ele sugere que o começo sempre mostra o fim e, por isso, nem sempre o final é feliz.
O que o aguarda? Não sabe.
Por ora, apenas o velho som melancólico.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Desdém



Não consegue sentir...?

E naquele momento de desespero, ela surgiu. Com um olhar intenso, um olhar pra dentro da alma. Intrigando-o. Ele esqueceu o que sentia e viveu um pouco de esperança. Era uma batida fraca, que vai e volta, vai e volta... Ela parecia perfeita. As palavras eram sensatas e a sensação era boa.

- Sempre haverá mudança, não é?

Não foi de repente, pois sempre brincou de observar as pessoas e não iria ser diferente com ela. Foi observando que o olhar não era tão intenso, pois andava cega com as pessoas. Almas vazias. A batida continuava fraca. Não ia e voltava, ia e voltava? Sentia... aquele velho gosto amargo.

A velha sensação de antes.

Um som qualquer, acompanhado por um olhar distante.
Um sorriso que desponta no canto da boca.
Esperança? Não existe tal coisa.
Volte pro começo. Ouça bem.
Abrace o som morno.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Desesperança



Ele anda alheio ao mundo. Vive as próprias ideias e anda sem medo. Absorto em seu próprio mundo. Não entende a importância de tanta confiança, de tanta estima. Vê contradições nas pessoas e acha tudo  desinteressante. Como por sua vida na mão de outras pessoas, crendo que elas mudarão sua vida? Isso não é atribuir poder? Isso não é uma forma de... ganância?

- Longe... do fim.

Por isso, alheio. Sem pressa, vivendo sem medo. É o que ele acha, pelo menos. Pois no seu próprio mundo, ele perde a noção dos sentidos e não confia em ninguém. E esse excesso de segurança - que faz tudo se tornar pouco (ou nada) interessante - é o que o torna poderoso. Ah, e a ganância... É algo tão volátil, não é? Porque ela é capaz de torná-lo ausente e não seja capaz de escutar aquele som...

Que som?
Ora, não está ouvindo?
O som descompassado, agonizante, atribulado...
Volte para o início, leia o título... Percebe que existe um som atribulado desde lá?
Pelo menos, consegue ver que agora ele ouve o tal som?
E sente medo?

Então, porque não o ajuda?

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Edição




Sentado no quarto escuro, vai ouvindo música e se editando. Entende o que faz, mas nunca analisou tão profundamente. Sabe que é algo que não vem de uma experiência arrebatadora, pois inspiração nunca significou muita coisa pra ele. Apenas fixa o olhar nas coisas mais simples e extrai delas algo mais elaborado.  Fascinado pela mão que paira no ar ao sentir o toque do vento. Ou pela água que cai do chuveiro e forma rios de pensamento. Acha que os pontos não são finais e que as reticências incitam o suspense. Pode ser criativo ou apenas tedioso, mas ama e sente. Vai vivendo e se editando, mas nunca mais vai deixar seus pedaços pelo caminho.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

memória-tempo



"O tempo se vai, mas algo eu sempre guardarei..."

O som vai me levando de volta. Aos poucos, lembro daquelas pessoas, daqueles lugares. Daquele tempo quando o tempo não era importante. Daquele tempo em que eu não pensava na vida: apenas vivia. Um tempo ingênuo, um tempo que o som era sentido e a letra era pensada, mas não pesada. Um tempo em que eu amava as segundas. Um tempo em que dava pra olhar pro céu e admirar as nuvens. Um tempo que se confunde com outros tempos.

A realidade me chama e, aos poucos, abandono aquele tempo. Não deixo minha memória lá (isso pode ser perigoso...), mas é sempre bom relembrar e viver um pouco daquele tempo. Amanhã posso voltar a ele novamente. Ou na próxima semana. Espero que haja tempo para isso. Escolho com cuidado a próxima música e trato de pensar no agora. E o agora me diz que o homem de hoje ainda é o menino daquele tempo.

terça-feira, 11 de setembro de 2012



"Shed that shallow skin, come and live again!"

Somos fúteis.

Estamos andando numa estrada e achamos que ela nunca terá fim. Que sempre será fácil voltar para o ponto de partida. Ignoramos o mapa, os sinais e as dicas de percurso que nos foram dadas. Ignoramos a mão estendida. Olhamos e ouvimos o que existe lá fora.

Até darmos conta que não temos tanto tempo. O caminho vai ficando mais escuro e mais difícil. E nesse caminho repleto de dúvida e imprecisão, nós escolhemos voltar. Escolhemos correr para o ponto seguro. Aceitamos viver e nos recusamos a apenas sobreviver. Olhamos para nós mesmos e ouvimos a quem nos quer bem. A quem importa. 

Seguimos o bom caminho.
Paramos de ser tão fúteis.
E vivemos felizes.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Prelúdio de um inverno triste



Começou a cair.
Intermitente.

Ela não notou.
Estava distraída.

Tornou-se contínua.
Ela ainda não percebeu.

"Espera..."
Tão tarde...

Essa água que escorre dos seus olhos
É teimosa e opulenta.

E não vai parar...
Nem por uma súplica.

domingo, 15 de julho de 2012




Com os dedos suspensos no ar, à espera de uma palavra que o alimentasse. Era assim que ele seguia, andando pelos cantos da forma estranha e habitual. Estava acostumado a observar, embora se proclamasse desligado. Analisava sorrisos e tentava entender o porquê das pessoas serem fascinantes e simplórias. Gostava do que era conceitual, mas a praticidade também o atraía. Tentava entender o que havia por trás de tantos gestos tão cheios de significado. E a vida dele era essa: viver escorado em armários, dizendo palavras que ela jamais ouviria. Sentia-se patético. Perdido. E solitário. Cansava de entender o mundo e seus sinais errados. Alguém poderia dizer para ele desistir, não? Assim ele se sentiria melhor. Não havia ninguém. O frio do quarto o abrigava, mas os dedos - agora inertes - pendiam diante de um doce som de desgosto.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Oxímoro

"Você é como as folhas que se aquecem ao sol...
Eu sou como as raízes que crescem na escuridão."
  
Só sabe andar despreocupadamente e com música nos ouvidos.
- Por acaso, não foi você quem me ensinou isso?
Todos se interessam, todos admiram, todos querem...
Mas todos conhecem?

Só sei andar com a mão nos bolsos e com música nos ouvidos.
- Por acaso, não foi você quem me ensinou isso?
A ninguém interessa, ninguém quer ver, a ninguém...
Por quê?

Como pode algo que expressa ausência ser tão visível?
Uma saudade tão presente...
Que, de alguma forma, me deixou dormente
E me fez mais insensível.

Eu prefiro o abstrato e você, o concreto.
Eu vivo esbarrando no real e você, na fantasia.
Uma cruel ironia entender esse aspecto?
Então saiba que te conto um conto em tom de poesia.

P.s.: Para Jhon. Por seu dia.

O todo, uma parte



Aquela foto nossa tá fora de foco...

Deixou-me perdê-lo.
Deixou-me entendê-lo.

Quando estava perto, consegui olhar para você?
Um dia saberei.

Olhar para trás é abraçar a nostalgia.
Olhar para frente é quase poesia.

Quando estou longe, perco a riqueza do detalhe.
Eu sei disso.

Seria exagero meu
Querer o todo à parte?

E desculpe-me o expressivo
Perdoe-me o passado
Mas querer o futuro
É mais que necessário.

Não quero mais perder você.
Daqui pra frente, só quero te entender.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Aspecto



Adeus

Sou ganancioso
Bastante insano
E tão fanático
Que não faço planos.

Eu só destruo
Me desespero
Sou tão vazio
Que nos sacrifico.

Passa-se o tempo
Não sou o mesmo
Já estou sozinho
E cheio de medo.

Com tanta fúria
Quase estou cego
"Não me espere, destino"
Sumirei no tempo.

Estou indo embora
De volta ao início
E por ser instável
Não me despeço.

Destruição



Não deixe-me ficar aqui
Até não existir pedra sobre pedra.

Se tu fizeres isso
Conseguirei recomeçar.

Lance-me um sombrio adeus
Mas nunca um olhar de misericórdia.

Pois recomeçar significa
que um dia entenderei este olhar.

Solidão



Tão definitivo...

Como posso ser dois
E ainda ser tão sozinho?

Sua presença, este momento...
O seu adeus é a resposta perfeita.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Envelhecimento



Sentado nessa cadeira, apenas vejo as horas passando lentamente. Quase como um rei. A diferença é que todos os meus súditos se foram. Não estou lamentando: é a constatação de um fato. O meu jeito analítico afastou as pessoas. Bem sei que elas não tentaram me compreender, mas eu também quis compreendê-las?

É só isso que me resta: uma porção de dúvidas.

Apenas lamento, pois sei que não posso mudar mais nada. Sim, lamento. Pregam que não posso me arrepender, mas lamento profundamente. O passado não me traz boas lembranças e o futuro não é promissor. Então, não há nada que eu possa fazer a não ser lamentar.

Sim, sou amargo. Mas também sou verdadeiro.

Não estarei aqui em breve. E esse breve não me atormenta mais. Então, só te peço um favor: deixe-me apodrecer neste lugar. Eu prometo que não tardará a acontecer. O abraço eventual do destino deve vir em breve...

Há muito tempo para despedidas.
Mas deixe-me dizer adeus.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Sacrifício



no time for goodbyes

Não viver.
Eu fiz isso por você.

Abri mão de minha coragem.
Hoje não sou nada além de surpresa.

E é assim que você me paga?
Com medo?

Vou viver.
E você não pode tirar isso de mim.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Vazio



No be, but be

Ser ou não ser?

Refletir sobre a essência das coisas é cansativo. Prefiro negá-las. É o caminho mais fácil para não doer: não ser. E não sendo, vou vivendo. E, se vivo, sou. Sei que é cansativo. Então, leia apenas de uma vez. 

Uma vez só...

De uma vez só, ela veio mudar o mundo. Ensinou-me coisas sérias de forma tola. Ensinou-me a ser. Uma ideia revoltante, eu sei... Pois não sou. E se não sou, eu vivo. Ou apenas sobrevivo?

Pare com a filosofia. Abrace o seu destino.

O meu cérebro fala isso. Nunca o vi, mas sei que existe. As ideias dela me alcançaram... O meu olhar continua perdido, mas agora enxergo o mar de possibilidades. "O destino é diferente de futuro...", diz o meu coração. Droga, me alcançaram mesmo... 

Então, sussurro àquela mão estendida:

- Obrigado.

Olá, futuro.
Para sempre.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Desespero




Uma piada de mau gosto. Eu me descreveria dessa forma. Esse sorriso que não sai do meu rosto reflete o que ocorre dentro de mim. Não tenho vontade de chorar, nem de sofrer. Apenas aprecio o momento e espero que ele seja o mais longo possível. Mais cedo ou mais tarde tudo acabará, então não é preciso ter pressa.

Talvez não acabe. Sinto como se não existisse fim.

Eis que surge aquela irônica criatura. Mais um sorriso no rosto de alguém... Pensei que conseguiria tirar aquele sorriso, mas em nenhum momento ele se deixou abater. O pior era entender que o sorriso dele tinha significado. E era um significado muito maior do que o meu desespero.

Pronto. O fim existe.

Por que essas lágrimas dela? Que idiotice... Ela sempre soube que um dia isso acabaria. Apenas eu que fingi não perceber... 

Lamento. Não quis parecer frio nesse momento. Eu sei que quando eu tocar o chão, tudo estará terminado.

Ele já parou de sorrir.
É mesmo o fim.

sábado, 2 de junho de 2012

Fanatismo


Sigo o ritmo dos pedestres. Amo esse passo lento... Continuo nesse cortejo e olho ao redor para ter uma ideia. Ideia de que? Afinal, minhas expectativas já estão depositadas. Espero um futuro feliz. Bem, feliz não é a palavra certa... Qual seria a palavra mais adequada? Não tenho tempo para pensar nisso, pois a procissão começou a ficar mais rápida. Que ritmo é esse? Que passo rápido é esse? Sinto arrogância nesses pés e não posso admitir que isso continue. Mas eu mesmo continuo. Por quê? Sou uma espécie de marionete? Alguém que não pode se desvencilhar do seu próprio destino? E as minhas expectativas? Por favor, destino, não me cure... Deixe-me andar no ritmo de antes. Deixe-me seguir o ritmo dos fiéis. Deixe-me descobrir qual é a palavra mais adequada!

Pausa?

Entendo sua arrogância. Não haverá mais passos. 
Nunca mais terei quaisquer expectativas.
E aquela palavra?

Não dá tempo... Que pena.
Pode juntar minhas mãos? Prometo que não irei separá-las.

Olá, destino.
A Deus.

domingo, 27 de maio de 2012

Loucura



Not perfect is GoOD

essa espera me atormenta.

viver e criar e viver e criar e viver é criar.

como agir quando devo apenas esperar?

e o novo é vivo e o novo é benéfico e o novo é perfeito.

"espere, espere..."
esse tempo me atormenta.

e se o novo não é benéfico... eu espero?

mas se espero, não crio. se crio, não vivo. se não...

se o que procuro não existe, qual o sentido?

entendi.
o que é imprevisível é sanidade.

perfeito.

então espero. e aceito. é o jeito...

é imperfeito

apresse-se, destino.
seja previsível!

abrace-me
e diga-me adeus.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Ganância



Aquela luz insignificante está muito forte.
Alguém pode fazer parar?

Eu preciso me livrar dessa luz.
Eu quero toda a escuridão.

É demais?
Quero muito?

Ela tenta andar e eu nada posso fazer.
Por que ainda me incomodo?

Livre da dor.
Acreditei nisso?

Ele disse que a dor ia parar.
Ele disse que não ia mais...

É tempo.
É tempo de ver o que o tempo me reserva.

Olá novamente, dor.
Olá e adeus.

sábado, 19 de maio de 2012

Afeto

"I still think of you each time I see the sun."

Encolhida em seu casaco rosa. Gasto. Uma herança de sua mãe.
Olhos azuis. Era linda.
Sabia o certo e o errado. E fazia por onde viver dessa forma.
Vivia um sonho e nunca o viu se realizar.

Por me deixar aquele casaco...
Por me fazer entender a beleza de todo mundo...
Por me mostrar o que é ser honesto...
Por me deixar viver seu sonho...

E por nunca me deixar, mesmo indo embora:

Obrigado.

domingo, 6 de maio de 2012



Sou uma tela em branco.


Resolvi pintar-me de diferentes formas, matizes, cores e tons.
Tons fortes e tons amenos.
Sinto em mim, todos os dias, novos traços. 
São traços bem desenhados. Traços marcados.
Mas sou apagado novamente. Mudo conforme as estações.


Sou uma tela em branco.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Definitivo


Eu sou aquele que só sabe o que é certo
E gosta do que é definitivo
Eu sou aquele que nem sabe mais errar
E se desvia do acaso infinito

Eu sou aquele que odeia a dúvida
E tem medo do distante
Eu sou aquele que preza pela certeza
E despreza o interessante

Eu sou aquele que anda sobre cordas seguras
Eu sou aquele que só conhece o rígido
E por ser tão inflexível
Foi pego desprotegido

Eu sou aquele que sequer olha para trás
Eu sou aquele que anda e navega só
E por estar tão certo em saber de tudo
Não sabe que é apenas pó

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Quase



Eu quase vi
mas me ausentei

Eu quase agi
mas nem tentei

Eu quase te amei
o medo quebrou o tempo

Eu quase quis
mas por quase viver
minha vida virou um talvez.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Ingênuo



Naquela manhã de sol
Ela voltou-se para mim, sorridente:


- Não é verdade que você me ama?
- Sim, bastante.

Fui tolo ao esperar uma resposta?
Ou mais tolo ao não perceber de imediato
Que o silêncio era a resposta dela?

terça-feira, 3 de abril de 2012

Kokoro 心



Para João

Eu não sou otimista. Eu prefiro o lado sombrio das coisas.

Sempre achei que a perda era o tom da minha vida e já havia me acostumado a isso. É mais fácil lidar com o conhecido. Por isso, sou frio, insensível e distante.

É isso que me faz humano.

Por isso, não me surpreendi quando a perda apareceu. O problema é que, dessa vez, eu não me acostumei com ela. Pelo contrário, me revoltei. Não queria lidar com a perda, eu queria ganhar. Pelo menos uma vez.

Você quis viver. Eu ganhei.

E a sensação era diferente dessa vez. Não era a de lidar com um conhecido que já sabe tudo sobre você. Dessa vez, era um desconhecido surpreendentemente agradável. E perdoe-me o egoísmo:

- Ganhar é agradável.

Entenda, eu continuo não sendo otimista e preferindo o vazio das coisas. E continuo frio, distante e (menos?) insensível, mas a perda já não é mais o tom da minha vida. No fim das contas, eu entendi... O tom da minha vida não é ganhar ou perder:

- É saber onde está o meu coração.

E eu estou bem certo que sem você não há coração.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Aquarela


Ela estava deitada na grama, olhando para o céu. Naquele dia, nuvens roxas. Não gostou, pois sabia que essa cor era cheia de medo, de dor. Não gostava de cores escuras. Pressentiu que algo ruim aconteceria e esperou. Sua amiga da rua chegou até ela e disse:

- Que você tá fazendo aí deitada? Vamos brincar!

12 anos. Era uma criança, afinal.

Gostava de olhar para as nuvens. Era o que mais gostava de fazer. E teria continuado ali deitada se não soubesse o que aconteceria. O problema era esse: ela sabia. Por isso, levantou-se sem vontade e foi brincar. Para se distrair, para pensar em outra coisa.

Para fugir de si mesma?

Viu de longe a mãe indo para o trabalho. Coitada. Tinha dois empregos em dois hospitais diferentes e mal parava em casa. Ela não a culpava. Entendia a situação e esperava. Era tudo que podia fazer. Esperou mais alguns minutos (eternos?) quando ouviu a voz do padrasto:

- Lúcia, hora de entrar.

A amiga já estava acostumada. O padrasto de Lúcia era um professor aposentado e muito exigente com os estudos da enteada. Lúcia foi andando sem pressa e entrou pela porta da cozinha. Ouviu a velha frase de sempre:

- Se você contar para alguém, eu mato sua mãe.

Lúcia tirou a roupa.
Tudo ficou preto.

***

Uma semana se passara e Lúcia estava olhando para as nuvens. Laranja. Não entendeu. Era sua cor predileta, mas incrivelmente rara. Significava um dia tranquilo, sem agitação. 

- Um dia de liberdade, talvez?

Voltou a si com o grito do padrasto, que a chamava para entrar. Mais uma vez, andou sem vontade e entrou pela porta da cozinha. O padrasto apontou para um bolo em cima do balcão:

- Sua mãe que fez.

Lúcia acenou com a cabeça. Sabia que a mãe a amava mais que tudo, por isso não podia deixá-la morrer. Tinha que aguentar. Tirou a roupa e esperou. O padrasto se aproximou, mas não falou nada. A menina arregalou os olhos e balbuciou algo no ouvido dele.

- O que foi, menina?
- Hoje... Não há ameaça...?
- Como é?!

Tudo ficou vermelho. Rapidamente, Lúcia alcançou a faca que estava em cima do balcão e fincou no pescoço do seu padrasto. Surpreso, ele agarrou o pescoço, mas era tarde: o sangue jorrava violentamente. Lúcia se aproximou e sussurrou em seu ouvido:

- Você não disse nada dessa vez.

O homem agonizava no chão. Lúcia tirou a faca do seu pescoço e a lavou cuidadosamente na pia. A menina aproximou-se do balcão, cortou uma fatia do bolo e comeu. Exclamou:

- Está uma delícia!

Era de laranja.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Percepção


Nihil

Eu quero contar a história
de alguém que não enxerga

Ele sabe que existem
motivos para viver
e agarra-se a eles como fiapos de esperança

Mas também entende
os motivos para morrer
e os celebra

Como sabe a diferença
entre eles?

Não há mais luz em seus olhos
para que possa distingui-los

Ele não consegue enxergar
não consegue ver nada...

Nada além da sua própria humanidade.

Posso contar novamente
a minha história?

quinta-feira, 15 de março de 2012

Sonata



Um pianista desajeitado compõe uma canção
E uma primorosa bailarina descreve passos

Será que é ganância
Colocar palavras numa canção que não deveria tê-las?

E se essas palavras completassem a melodia
Ainda seria ganância minha?

Perdoe-me, então...

Que o beijo deles seja todas as palavras desta canção.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Vivace



Tocava uma melodia suave e rápida. Ao longo do caminho, ia errando acordes e tempos... Mas nunca havia tocado uma canção com tanta intensidade, com tanta alegria. Era uma canção desajeitada, mas cheia de sentimento. E isso importava.

Ela dançava a cada novo som que saía daquele piano. Os passos preenchiam os erros de execução e todos os acordes desafinados que ressoavam pela sala. Cada movimento dela era invejável, parecia que tinha ensaiado durante anos para aquele momento... Era a dança perfeita para uma música tão pobre. 

Mas pobre para quem?

Agora que a encontrara, não queria mais deixá-la ir. Foi necessário que ela desse o passo decisivo para que a música terminasse. Ele deu o acorde final e encheu-se de medo, mas ela não quis ir embora.

Ele ficou feliz. Sentiu-se inundado pela vida. A vida que é sinônimo de amor.
E adorou a canção.
E cada movimento doce dela.
Olhou nos olhos da dançarina.
Vivace.

terça-feira, 13 de março de 2012

Interlúdio


"Esse não é o momento inadequado
para se fazer uma pausa?"

Mas eu olho para ele,
eu olho para ela
e me pergunto:

"Esse não é o momento perfeito
para um novo andamento?"

quinta-feira, 8 de março de 2012

Allegro



Nunca se sentiu pequeno diante do piano. Agora não o via como um mero instrumento de trabalho. 
Era como um amigo pra quem ele havia esquecido de dizer adeus. 
Aproximou-se dele e deslizou os dedos pelas teclas, suavemente. Pensou em tocá-lo, mas...

"Como poderia ele
Tocar uma canção desafinada?"

Ela  estava absorta. Olhava para aquele pássaro insistente e não entendia o porquê dele estar tão distante.
Mas ele era tão belo... Como poderia trazer tanta angústia?
"Será que é porque a angústia não é ele quem traz?", pensou. 

"Como poderia ela
Não mostrar seu coração?"

Levantou-se, pois havia entendido que nunca tocara com tanta perfeição assim.
Chegou à conclusão que era impossível. Não tinha mais motivos para se esconder por tanto tempo. 
Sempre fora um desajustado querendo prever o futuro.
Sempre fora uma deslocada procurando motivos para sorrir.

Ele aproximou-se do piano e tocou o primeiro acorde. Errado.
Ela deu um salto e parou perto dele. Perfeito.

Os dois se encararam e sorriram.
Esse mo[vi]mento feliz.
Allegro.

"O começo é sempre doce.
O começo é sempre suave."

Agitato




"'Um presente divino...'
Era o coro dos idólatras..."

Uma bailarina. Incrível. Era suave e intensa. Como a beleza de um furacão que destrói tudo por onde passa. E ela estava no centro desse ciclone. Os seus pés rodopiavam como o vento, mas ela estava tranquila... 
O seu mundo era cheio de reticências e seus olhos eram de uma expressão pacífica. 

Quem a olhasse de perto, estranharia. Os aplausos eram destinados aos seus pés, por isso não notavam. Ninguém notava. O que havia, afinal, por trás de olhos tão pacíficos? E qual era o sentido por trás de cada movimento?

"Os pés dela pareciam estrelas
Caídas do céu, luz na terra..."

Ela não sabia.
Tinha um coração e estava bem certa disso. Mas por que mostrá-lo?

Os sentimentos dentro dela eram como um pássaro bonito que não quer cantar. A gaiola dourada não lhe dava significado. E a gaiola era ela. Por isso, ela ansiava se libertar de si mesma e pegar esse pássaro.

Para libertá-lo?
Não. Só para poder estraçalhá-lo com suas próprias mãos e nunca mais sentir essa angústia, essa agonia...

Esse movimento rápido.
Agitato.

"O começo é sempre doce,
Mas não nesse caso."

terça-feira, 6 de março de 2012

Adagio




"Das mãos dos comuns saem ouro
Das minhas, diamantes..."

Um excelente pianista. Isso era indiscutível. Por isso, talvez, prezasse tanto pela integridade das suas mãos. Não as considerava participantes do seu corpo: eram a sua razão de existir. Mais que ferramentas de trabalho, eram o seu próprio meio. A vaidade lhe tornara daquele jeito, os aplausos eram como água para ele e a necessidade de reconhecimento regia seu comportamento.

Por outro lado, era frio. Completamente alheio ao que acontecia ao seu redor. Não se importava e isso era uma constante. Por isso, baixava os olhos e bocejava com frequência. Parecia arrogante e mal-educado. E era. O não se importar era mais fascinante do que a tola concepção de amor.

"Ele andava com as mãos nos bolsos
E isso era o sinal de sua arrogância..."

Dor.
Rápida.

"Incapacitado de exercer movimentos.", foi o diagnóstico que ouviu. Com um ponto que não deixava dúvidas. Antes, odiava essas dúvidas. Eram sinônimo de fraqueza. O certo é que não havia o que fazer. Apenas esperar e ver para onde o tempo o levaria. E essa espera era uma tortura, pois se mostrava através de um movimento lento... 

Perdão, não tão lento. 
Um adagio.

"O começo é sempre suave
Mas não nesse caso."

segunda-feira, 5 de março de 2012

Prelúdio


O começo é sempre suave
Mas não nesse caso

Ele andava com as mãos nos bolsos
E isso era o sinal de sua arrogância

"Das mãos dos comuns saem ouro
Das minhas, diamantes"

O começo é sempre doce
Mas não nesse caso

Os pés dela pareciam estrelas
Caídas do céu, luz na terra

"Um presente divino..."
Era o coro dos idólatras

Como poderia ele
Tocar uma canção desafinada?

Como poderia ela
Não mostrar seu coração?

O começo é sempre doce
O começo é sempre suave

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Primavera



"Eu quero que você coloque um sorriso no rosto e a primavera nos passos." 
(Clay Johnson, The Closer)

Ele havia ido embora.

O mundo não era como antes e isso a deixava imensamente feliz.

Ele havia dito que voltaria. E ela sabia que era verdade, pois confiava nele. Ela não havia lhe dedicado paixão ou romance ou fanatismo ou dor ou troca. Havia depositado confiança nele e isso era maior que o seu próprio mundo. Mesmo que voltasse a chover, ela poderia olhar para cima e se sentir abraçada. O amor a libertara para sempre.

O parque estava cheio de sol e seus cabelos loiros brilhavam mais que nunca. Ela se dirigiu à saída do parque, pois estava disposta a abandonar aquele banco para sempre. A partir dali, os pontos não seriam mais tão cheios de dor. Não olhou para trás, mas parou na entrada do parque, sorrindo:

- É assim que é o fim?

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Inverno (Prece)

Primavera, vem depressa
                                 Eu não agüento mais chover.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

A chuva (Adeus)



“Someone else can come and save me from myself...” (L.P.)

Ele olhou para aquele lugar e sorriu:

- Um pouco bagunçado, não é?

Ela teve tanta raiva, que não olhou mais para ele. Como ele poderia brincar com uma coisa tão séria? Não... Essa não era o verdadeiro motivo para tanta raiva e ela sabia. O parque de outrora era o céu e as nuvens carregadas e densas eram o chão daquele lugar. Continuava chovendo, mas a chuva corria do chão e se encontrava com o parque-céu.

Aquele mundo é que era o motivo do ódio.
Caminhar no vazio era o motivo.

Ele não parecia surpreso ou chateado. Apenas olhava para as árvores e para o banco lá de cima. Perdeu um minuto examinando o local, até que olhou para ela e disse:

- Você confia em mim.

Era uma pergunta? “Não, parece uma afirmação...”, ela refletiu. E teve raiva de tamanha ousadia. Ela não confiava em ninguém, apenas nos seus instintos e até estes se provaram errados ao longo do tempo... Ela não confiava nem em si mesma, eis a grande verdade. Por isso, aquele mundo era daquele jeito.

- Aqui não para de chover... – conseguiu dizer, com algum peso na voz.
- Você continua olhando para o chão. Como vai saber se parou de chover?

A pergunta dele ecoou pela sala. Ela arriscou um olhar para fora e percebeu que a chuva, de fato, havia parado. Olhou para cima, esperançosa, mas a água continuava caindo. Percebeu que chovia apenas naquele espaço onde eles estavam. Lá fora havia sol, havia cor, havia luz. Havia. Sentiu inveja e falou, já sem forças:

- Nunca vai parar...
- Não fale mais isso – ele interrompeu – Nunca mais.

Ela olhou nos olhos dele.

- Por ter confiado em mim, a chuva finalmente vai parar.

Ele prosseguiu:

- O que você precisa é de um pouco de perspectiva...

Ele se afastou um pouco:

- Sabe qual é o grande segredo?

Ela finalmente olhou para o parque. A chuva se misturava com um líquido vermelho lá embaixo. Olhou para ele e percebeu que aquilo escorria das mãos dele. Ele se aproximou e falou baixo no ouvido dela:

- O sangue é mais espesso que a água.

Ele olhou apenas para ela e sorriu.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Inverno (Dúvida)



"Don't put a finger in my heart."
(Frase do volume 51 de Bleach - Love me Bitterly, Loth me Sweetly)

O medo é meu companheiro
Por isso...

Perdão.

Quando vai parar
Com essa forma imprudente de agir?

domingo, 19 de fevereiro de 2012

O mundo invertido



Cíclico

Ainda fazia sol quando ele entrou no parque. Andou um bocado de tempo, olhando o movimento das pessoas e a alegria do lugar. Levou um guarda-chuva, pois sabia que ia chover.

Era a certeza de quem gostava de olhar para o céu.

E, de fato, começou a chover. Ele abriu o guarda-chuva e encaminhou-se para a saída do parque, mas uma pessoa chamou a sua atenção: aquela moça loira que estava sentada naquele banco. Ela ignorava completamente a chuva. Ele aproximou-se e sentou-se no banco em frente ao dela. Ela apenas sussurrou:

- Esse é o lugar dele.

“Dele ou meu?”, ela pensou. Não conseguia identificar a diferença que havia. Riu de si mesma, pois isso era irônico.

- Oi. Tudo bem com você?

A saudação a embaraçou. Não queria falar com desconhecidos. A experiência anterior não fora satisfatória. Resolveu ignorá-lo, mas isso não o impediu de continuar falando:

- Você não prefere sair dessa chuva? Vai acabar doente...

“Que chato... Ele não cala a boca nunca?”, ela pensou. Ele continuou a falar sozinho por um bom tempo e a analisava, pois achava as pessoas fascinantes. Mais que as nuvens. “Todo mundo tem uma boa história pra contar...”, ele dizia. Continuou falando quando percebeu que havia captado a atenção dela:

- O que você disse? – ela perguntou.
- Ah! Por que você está nessa chuva?

Ela sorriu brevemente. Pensou se deveria... “Será que ele se importa mesmo? É apenas um desconhecido...” Ela estava tão cheia de pontos que um a mais não faria diferença. Resolveu arriscar. Olhou profundamente nos olhos dele e disse pausadamente:

- Já que você quer tanto saber...

Tudo pareceu sair do lugar, mas ele não teve medo.

- Bem vindo...

O mundo estava de cabeça para baixo.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Convite para uma despedida (Ou A chuva, parte 2)


The big picture

Começou a cair uma chuva grossa.

O meu companheiro estava sentado na minha frente.
Parecia que ele estava começando a entender...

Ela não se importou, pois não fez menção de retirar os fones de ouvido. Muito menos de fazer qualquer movimento. Ela apenas deixou gentilmente que o headset repousasse em seu pescoço.

Não quero mais ouvir canções de amor. O adeus havia sido dito naquele banco. Chorei. Eu sei que parece tolo, mas eu prometi que seria sincera. A blusa vermelha que eu uso agora... Eu não deveria...

O sobretudo claro mudou para uma cor escura.

Foi quando o meu companheiro apareceu pela primeira vez. Simpático. Olhos gentis. Levou-me pelo braço e cuidou de mim. Não era um bom ouvinte, mas me distraía. Parecia me conhecer muito bem...

 E aconteceu uma pausa.

O headset na minha nuca forçava-me a olhar diretamente para o meu amigo. Ele parecia abismado, como se nunca tivesse me visto antes. Será...

Perfeita.

Entendo.

Dolorosa.

Ele descobriu.

“Cada ponto é carregado de dor”, pensei.

Que ele e eu somos a mesma pessoa.

A chuva estava muito forte, mas eu poderia jurar que havia lágrimas em nossos olhos quando falamos:

- Nunca vai parar de cair.

Eu estava sozinha mais uma vez.
E havia apenas começado.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

O abrigo


“Didn’t want a life without you, but here I am living one...” (Brooke Fraser)

Eu tenho muitos pensamentos. O meu companheiro nem desconfia deles, imagino. Tento esquecê-los, mas eles me invadem e me tiram o sono. Eu sei que parece desculpa para uma fuga... Eu sei que sou solitária. Eu sou uma reclusa. O meu companheiro era a única companhia disponível. Por isso, o surpreendo:

- Vou dar uma volta.

Uma calça qualquer. Um sapato qualquer. A música de sempre.
Mas eu não posso ignorar a blusa dela.

É perfeita para a ocasião. O meu companheiro não me lançou sequer um olhar, apenas me acompanhou. “Ele não sabe mesmo”, rio por dentro. Cubro a blusa com um sobretudo claro e saio de casa. O sol estava mais forte e a nuvem permanecia no céu, mas não quero falar sobre ela. Os meus pés me conduzem para o parque. Há movimento, mas eu estou alheia a tudo. Sento naquele banco específico, onde eu havia me despedido dela para sempre.

Eu sinto falta dela.
Eu sinto falta de como eu era.