quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Canção de nuvem e areia

Eu escrevo ao grande amor inatingível
Sim, dedico fracas linhas ao idealizado
Os dedos raspam no mistério intocado
Mas é sombra o sentimento intangível

Ainda canto ao grande tempo desperdiçado
Sim, desafino em favor do que é crível
Mas se desfaço a sutileza do atingível
Não corro o risco de soar muito apressado?

Quando a hora é areia e o coração é nuvem
Vê-se a ilusão nos amantes que se abrasam
Mas o som do relógio nos torna pragmáticos
E me constrange soar tão amorosamente ingrato

Que a areia e a nuvem se queiram e se enluvem
Mas é bobagem: opostos apenas se acusam
E hoje não mais faço coro aos gramáticos
Insisto que o tempo é concreto e o amor, abstrato.

domingo, 5 de outubro de 2014

Mudança

Eles acham certo amar os pequenos pedaços de vida espalhados pelo mundo. Recortam a poesia em imagens fugazes, exaltam a nostalgia e se armam com o romantismo. Vivem o sofrimento com intensidade. O eu-lírico é uma muralha intransponível - quem o entende? O tom seguro do desgosto supera o do otimismo. As penitências se acumulam. pois a fé é a razão central da existência. Enchem-se de falsa amargura e de um raso vazio existencial.

Onde está o amor inteiro, concreto? E a poesia que não está atrelada a imagens? Por que essa irritante nostalgia do que está preso nas fotos? Qual é a dificuldade de entender o eu-lírico? Não é um ser inatingível, incriado... Perdoem a arrogância, mas ele é tão humano quanto todos nós. O tempo passa, ele cresce e vive, mas ainda é irremediavelmente humano - graças a Deus! - por isso, a pergunta: qual a dificuldade? Uma espécie de falsa modéstia? Ou apenas uma crença maluca?

Não importa que ele questione o mundo. A resposta é sempre o sofrimento. Nesse mundo, todos sofrem da mesma forma, do mesmo jeito, com as mesmas dores.

Ele está farto desse mundo.