terça-feira, 28 de maio de 2013

Vossa vontade, nosso reino



Proclama o divino:
"Os arrogantes caem!"
Ela nem esboça reação
Não entende o verbo.

"O céu é um trono
E quem nele senta é solitário"
Ela nem tem mais tempo
Para entender tal segredo.

"O tempo é tão curto
Mas o reino é vosso..."
Ele nem sabe o que esperar
Apenas contempla.

O seu olhar se enche
Da mais profunda soberba
Ele nem escuta os arautos
Que predizem sua queda.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Santificado, nome vão


O que ela insiste em encarar, ele insiste em esconder...

Ele se destaca na multidão
Não consegue compreender os motivos dela
Esquece da prece, há tempos não faz
Não quer entender

O medo enche logo o seu coração
Arrisca um suspiro diante da que era tão bela
A cor foge do rosto, já respira mal
Afasta-se de ser

Ele usa aquele nome em vão
Por que, dentre todos, aos céus apela?
Vai embora, depressa, não olha pra trás
Só quer esquecer

Ele agora só anda e olha pro chão
O céu funciona como uma remota capela
O desespero constrói a distância abissal
Começa a morrer

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Estais no céu?



Não consegue mais olhar para as nuvens
Os olhos agora estão fixos no chão.
Tão distante, ouve-se um som amargo:
"Não olhe, não olhe..."

Cansou de esperar dos céus um socorro
Deu ouvidos à voz desesperada dos aflitos
Tão perto, o vento parece escrever:
"Não ouça, não ouça..."

Sem firmeza, parece andar sobre as nuvens
Vacila, mas executa seus passos no ar
Atinge o chão com espanto profundo
E tinge de rubro o chão tão cinzento.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Pai Nosso


Junta as mãos, deitada no chão
Dirige o seu olhar ao branco forro
Explora suas dores com doce afinco
Pois quer transformar o futuro em horas.

Recita, sem pressa, a velha oração
Não sente que não existe conforto
O tempo, no entanto, não atende os caprichos
De alguém que procura livrar-se do agora.

Ouve-se o som de um longo murmúrio
Repete o rito, mas perde o ritmo
O som diluído se traduz em desgosto.

Os lábios se fecham em um breve sussurro
- Percebe agora a dor de ter crido?
E mergulha sua prece no fim silencioso.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Realidade



Parou diante daquele sorriso. Atitude tola, mas não conseguiu evitar o ridículo. Achou irônico que um simples sorriso desarmasse seu impulso de voltar ao desconforto do quarto. Percebeu que não havia mais sorriso, pois a moça já havia baixado o olhar e voltado à leitura que fazia. No entanto, a sensação ficara. Sentiu-se extremamente tolo. E limitado.

E pensou.

E teve raiva do seu excesso de análise.

- E se eu apenas fosse de uma vez?

Percebeu que a sensação era de urgência. Aquele sorriso simbolizava tudo o que perdera e estava com medo de conseguir a liberdade de volta. Fitou a moça, que parecia meditar no que lia. Ela parecia feliz. Parecia viva! Sabia que andar lá fora era um tiro no escuro, mas o que custava arriscar? 

- Estou no escuro de qualquer forma...

Um pé pra fora do quarto. Ela sorriu novamente.
E não conseguiu evitar sorrir de volta.

Sabia que o resto era apenas história.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Incerteza




Parou diante daquela luz. Sabia que deveria arriscar. Uma luz forte, convidativa. Conseguiu vislumbrar vultos dentro daquela luz. Vultos do presente alheio, sombras de um futuro agradável. Vislumbrou mais futuro que presente, mas estava indeciso. Como abandonar aquele lugar? Até então, aquilo não tinha sido seu chão? Se abandonasse, pareceria ingratidão e isso era intolerável...

- Não era?

Pensou na própria estupidez, pois não pesara o pretérito ao abrir aquela porta. E agora que o fazia, percebeu o quão ganancioso era. Estava disposto a abandonar a segurança do seu mundo pelo risco de uma talvez alegria. "Bobagem... A alegria nunca se reflete num talvez. Ou é ou não é!", pensou. No entanto, sentia algo inexplicavelmente bom pra fora daquele lugar.

Pensou em seus próprios limites. Tudo agora se limitava à ação. Ir ou não ir. "Existe ação impensada?", murmurou. Não ouviu resposta, apenas o silêncio habitual. Perguntou-se se deveria focar mais naquela luz que emergia da porta. Apertou os olhos. Distinguiu a figura de uma moça morena do outro lado da rua. Ela sorriu, amigável.

Sabia que deveria arriscar.
Sim, sabia.