terça-feira, 31 de dezembro de 2013

O brinde



Ajeitava o nó da gravata quando ouviu a voz da mulher o chamando. O ritual sempre se repetia: a grande festa, os convidados, os aplausos, as notas nas colunas sociais do dia seguinte... Pensou na vida abastada que tinha e um sorriso discreto brotou nos seus lábios. Sabia que era um homem de sorte. Tinha os melhores carros, a melhor casa, a melhor família... Tinha os melhores amigos e gozava de grande prestígio na sociedade.

A vida era boa.

Desceu as escadas e a salva de palmas ressoou no amplo salão. Pegou suavemente na mão da esposa e conduziu os convidados para a sala de jantar. Dirigiu-se ao extremo da mesa, segurou a taça de vinho e preparou o  seu melhor sorriso. Estavam ali amigos, conhecidos, sócios, pessoas importantes e queridas. O anfitrião encarou cada um dos presentes. Todos aguardavam o discurso ansiosamente.

Percebera que não.

Sentou-se e não proferiu uma única palavra. Os convidados se entreolharam, confusos. A mulher apertou a mão dele, esperando alguma resposta. Ele apenas levou o vinho aos lábios e esperou. A vaia dos convivas não tardou. Alguns vociferaram insultos, enquanto outros apenas levantaram-se e dirigiram-se à saída, ultrajados. O gosto rascante do vinho amplificava o som do desgosto que pairava no ar. A esposa do anfitrião não conseguiu conter as lágrimas e foi-se embora, aos soluços. Em pouco tempo, estava completamente sozinho.

Carpe Diem.

domingo, 22 de dezembro de 2013

Inevitável



Pra Jéssica.

Evitar...

Um dos verbos que mais utilizamos em nossas vidas. Sim, evitamos falar verdades porque elas magoarão os outros. Evitamos ser quem somos porque é incômodo lidar com o incomum. Evitamos sentir, pois emoções são coisas perigosas e devem ser guardadas a sete chaves. Evitamos tudo e tudo nos evita. Mas sentíamos que éramos diferentes! Não evitávamos nada e nós não nos evitávamos... Até tentarmos evitar o verbo ir, mas não há como negar o presente:

- Você vai.

Comecei a perceber que não éramos tão diferentes assim. Eu não era, pelo menos. Eu sempre evitei o suspense, pois bem sei que você prefere fantasia ao terror. Eu evitei a timidez, pois encarar a verdade de frente sempre é libertador. Eu evitei a mesmice, pois o que eles viram como mudança, eu vi como melhora. E hoje também evito a saudade, pois ela é definida por algo do passado que não temos por perto e eu não posso sentir saudade de alguém que sempre estará aqui...

- E o amor?

Perdoe-me. 
Esse eu não pude evitar.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Retrospecto



Ao futuro.

Começar sempre é o mais difícil. Você faz suas listas, estende suas preces, fecha os olhos e torce pelo melhor. Sem esperar. Há sempre a pressa em manter-se ágil. Gostamos da ação, do movimento, das cores fortes, da celebração intensa. Nessa intensidade de viver em movimento, não sentimos que o tempo brinca conosco. Tudo é uma grande diversão. Não há tempo para admirar o tempo.

Ledo engano.

Pensamos que levamos a vida. Na maioria das vezes, ela nos carrega por aí. Como o vento leva a poeira pra longe. E o tempo, oportuno, nos lembra que há tempo para estar em movimento, mas também há tempo para esperar. E a espera nos aflige, pois é lenta, preguiçosa e nos resta pouquíssimas escolhas diante dela... Diante de nossas súplicas, se mostra inexorável... O que nos resta? Resignação?!

Há tempos que não.