sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

A chuva (Adeus)



“Someone else can come and save me from myself...” (L.P.)

Ele olhou para aquele lugar e sorriu:

- Um pouco bagunçado, não é?

Ela teve tanta raiva, que não olhou mais para ele. Como ele poderia brincar com uma coisa tão séria? Não... Essa não era o verdadeiro motivo para tanta raiva e ela sabia. O parque de outrora era o céu e as nuvens carregadas e densas eram o chão daquele lugar. Continuava chovendo, mas a chuva corria do chão e se encontrava com o parque-céu.

Aquele mundo é que era o motivo do ódio.
Caminhar no vazio era o motivo.

Ele não parecia surpreso ou chateado. Apenas olhava para as árvores e para o banco lá de cima. Perdeu um minuto examinando o local, até que olhou para ela e disse:

- Você confia em mim.

Era uma pergunta? “Não, parece uma afirmação...”, ela refletiu. E teve raiva de tamanha ousadia. Ela não confiava em ninguém, apenas nos seus instintos e até estes se provaram errados ao longo do tempo... Ela não confiava nem em si mesma, eis a grande verdade. Por isso, aquele mundo era daquele jeito.

- Aqui não para de chover... – conseguiu dizer, com algum peso na voz.
- Você continua olhando para o chão. Como vai saber se parou de chover?

A pergunta dele ecoou pela sala. Ela arriscou um olhar para fora e percebeu que a chuva, de fato, havia parado. Olhou para cima, esperançosa, mas a água continuava caindo. Percebeu que chovia apenas naquele espaço onde eles estavam. Lá fora havia sol, havia cor, havia luz. Havia. Sentiu inveja e falou, já sem forças:

- Nunca vai parar...
- Não fale mais isso – ele interrompeu – Nunca mais.

Ela olhou nos olhos dele.

- Por ter confiado em mim, a chuva finalmente vai parar.

Ele prosseguiu:

- O que você precisa é de um pouco de perspectiva...

Ele se afastou um pouco:

- Sabe qual é o grande segredo?

Ela finalmente olhou para o parque. A chuva se misturava com um líquido vermelho lá embaixo. Olhou para ele e percebeu que aquilo escorria das mãos dele. Ele se aproximou e falou baixo no ouvido dela:

- O sangue é mais espesso que a água.

Ele olhou apenas para ela e sorriu.

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