sexta-feira, 29 de março de 2013

Vermelho




A menina do vestido vermelho andava pela calçada. Sem pressa, quase saltitando. Ela sentia que aquele era um dia de sorte, mas não podia expressar sua felicidade. Estava tão ocupada em seus pensamentos que não notou o par de olhos que seguiam seus passos. O homem percebeu que ela andava sozinha e estava cada vez mais perto dela. Ela parou diante do semáforo fechado.

- Está perdida?

Ela titubeou. O tom dele era caloroso. Ela sentiu medo por uma fração de segundo, mas voltou a ficar alegre. Sabia que, em breve, estaria em casa.

- Posso te levar pra casa... Segura a minha mão!

Sem hesitar, a menina segurou firme a mão do homem e indicou o caminho com a mão livre. Estava a poucas quadras de sua casa. O homem sorriu, discretamente. Olhou para os lados e certificou-se de que ninguém prestara atenção. Fitou a menina. "Deve ter uns dez anos, talvez menos", pensou. Sentiu que era o seu dia de sorte, mas não podia expressar sua felicidade. A menina indicou a rua à esquerda e ele obedeceu.

- Seus pais estão em casa?

Ela balançou a cabeça, em negativa. "Que sorte...", sorriu. Aproximaram-se da casa nº 33 e ela tirou uma chave do bolso do vestido. Era tão magra que o vestido dançava em seu corpo. Ela estendeu a chave para o homem e sorriu. Ele retribuiu o sorriso e abriu a porta. Ela entrou primeiro e ele a seguiu no escuro. Sentiu uma pontada no pescoço e, em seguida, o gosto do assoalho. 

Escuridão.

***

Acordou horas depois, assustado. Tentou se mover, mas os braços e pernas estavam presos. Estava sentado numa cadeira de dentista. Olhou ao redor, mas não viu ninguém. Estava numa espécie de porão. A iluminação era precária, mas distinguiu a silhueta de uma mulher se aproximando:

- Ah, acordou? Pensava que ia descansar mais, seu dorminhoco! - sorriu, afável, e prosseguiu: - Obrigada por trazer minha irmã pra casa...

O homem percebeu o vulto da menina ao lado da mulher. Ela o encarava, friamente. Percebeu que se encontrava numa situação desfavorável e pôs-se a gritar. A mulher apontou:

- Essas paredes são grossas. Ninguém vai ouvir seus gritos.

- O que eu estou fazendo aqui? - perguntou o homem, com desespero.

- Ora, você veio em busca de diversão, certo? - a mulher provocou - Pena que eu sou velha demais pro seu gosto, não é?

Ele ficou calado. "Burro, burro!", castigou-se mentalmente, "É óbvio que ela não estaria sozinha em casa!". 

- O que você quer? Dinheiro? - conseguiu perguntar, após um longo suspiro.

- Dinheiro não me interessa. O pouco que tem na sua carteira já é meu, de qualquer forma. Você tem uma vida muito entediante, Valter... - ele a encarou com ódio - Sim, vi seu nome na sua identidade. Sei que você é um simples dono de loja, casado...

De repente, a mulher ficou calada e fez um sinal para a menina, que sumiu de vista. A mulher prosseguiu:

- Sua carteira me disse muita coisa, Valter... Sei que tem duas filhas. Será que você faz com elas a mesma coisa que queria fazer com a minha irmã? - perguntou, sem emoção.

Ele não respondeu. O homem escutou o som de algo sendo empurrado. A menina apareceu diante dele empurrando uma espécie de carrinho. Quando Valter percebeu o que estava em cima do carrinho, um calafrio percorreu sua nuca. Distraído, não percebeu que a menina se aproximava com um pano. Tentou gritar novamente, mas a menina conseguiu amordaçá-lo sem problemas.

- Deixe-me dizer uma coisa, Valter... Eu conheço homens como você. Você gosta de meninas novinhas... E quanto mais novinhas, melhor! - havia desprezo na voz da irmã da menina - Você se engana, dizendo que será a última vez, mas sempre continua...

Ela aproximou o rosto

- Sabe o que você é, Valter? Você é sujo!

Ela pegou o alicate que estava em cima do carrinho.

- Deixe-me purificá-lo.

A mulher começou a puxar as unhas dele com o alicate. Ele urrava de dor e o sangue jorrava de seus dedos. O homem notou que havia um sorriso no rosto da menina.

Então, houve apenas silêncio.

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